Tóquio, 17 mar (EFE).- Uma iniciativa da Assembleia de Tóquio para restringir a venda de histórias em quadrinhos com cenas sexuais que envolvam menores levantou uma polêmica no mundo do mangá e nos fóruns japoneses na internet.
Na animação e no mangá, símbolos por excelência da cultura pop do Japão, é comum mostrar meninas de aparência pueril com minissaias sugestivas e grandes decotes, em histórias que frequentemente têm uma carga sexual mais ou menos velada.
Na próxima sexta-feira, a Assembleia liderada pelo prefeito conservador de Tóquio, Shintaro Ishihara, debaterá a polêmica lei que, se aprovada, proibirá que as histórias em quadrinhos e a animação sejam vendidas a menores de 18 anos na capital japonesa.
O projeto suscitou um polêmico debate entre os desenhistas e em fóruns na internet, nos quais os leitores qualificam o projeto como censura e consideram que a iniciativa contém uma definição vaga demais sobre os critérios.
Se aprovado o texto, os personagens de mangá terão que demonstrar claramente que são maiores de idade.
A proposta afeta qualquer personagem de mangá ou de animação que possa ser considerado menor de 18 anos por sua "idade, roupa, acessórios, escolaridade, cenário onde se encontra, idade de outros personagens ou voz".
Esses personagens não poderão "estar envolvidos" ou "aparentemente envolvidos" em atividades que sejam "ou pareçam" sexuais, ou ainda que impeçam o "desenvolvimento saudável das faculdades sexuais dos jovens".
No meio da polêmica, um grupo de desenhistas manifestou hoje em frente à Prefeitura de Tóquio para expressar preocupação e pedir que a normativa seja mais específica para evitar tentativas de censura.
"Vi casos em que nossa cultura perdeu poder por culpa de normativas. Queremos que as regras sejam decididas pelos leitores", declarou o desenhista Tetsuya Chiba, criador de séries de mangá como "Ashita no Joe".
Para a desenhista Machiko Satonaka, a proposta interfere na liberdade de expressão e está aberta "a interpretações variadas", o que permitiria ao Governo "regular inclusive os personagens de história em quadrinhos, embora não causem dano a ninguém".
Vários roteiristas insistem que essa norma põe em perigo a iconografia da cultura mangá e lembram que também dentro dessa arte há categorias, que vão desde inocentes histórias infantis até pornografia para adultos.
Esta última pode se encontrar em estabelecimentos como os que abundam no bairro de Akihabara - centro do mangá na capital japonesa -, nos quais os menores já são proibidos de entrar.
"Se o conteúdo da história em quadrinhos ou da animação é pornográfico, creio que seja bom se for limitado", disse à Agência Efe o espanhol Alain García, blogueiro e criador do site "Ao Japão" (www.ajapon.com), especializado em cultura japonesa.
"Mas em muitos mangás há meninas e meninos menores de idade: se não envolve nada pornográfico, sua venda não tem nada de mau", considerou.
O projeto legislativo sobre mangá e animação está incluído na revisão de uma política mais ampla que pretende proteger o "desenvolvimento saudável dos jovens" e que poderia também limitar alguns conteúdos da internet dirigidos a menores.
À margem da carga mais ou menos sexual, as publicações de mangá foram, em algumas ocasiões, objeto de polêmica no Japão por questões como a temática, considerada por vezes agressiva ou que incita à violência.
Em setembro passado, uma adaptação da obra de Adolf Hitler "Minha luta" ao formato de história em quadrinhos japonês suscitou uma onda de críticas, mas as vendas da publicação dispararam no mercado japonês.
As livrarias japonesas abrigam obras de mangá bastante valiosas, como a recentemente publicada "Lenda de Koizumi", uma sátira política que, segundo indicava recentemente o jornal "The Guardian", é "o melhor romance contemporâneo do Japão". EFE